sábado, 4 de julho de 2009

Cartas ao Poeta I: Discursos da Mente



Meus olhos se fecham e ainda posso ver. Imagens, discursos, tons Almodóvar e você chegar perto de mim. Ao mesmo instante sinto a distancia dispersar cores e os tons tornarem-se cinzas. Michael Ende sabe muito destes tons, tomamos café e ele me contou.

Cinzas e cinzas do que não deu tempo para ficar pronto. E talvez nunca fique, porque o movimento é constante. Não creio que tenho me enganado a sentir presenças. Não mesmo! Parece que brinca de doar. Quando pensei que o presente era meu também, me enganei. Presenteamos-nos o tempo todo, e achei que poderia ser um pouco meu alguns presentes.

Riscos e rabiscos. Versos e verdades. Segredos e cumplicidades tornam-se cinzas. Cores e texturas. Íris e imagens fotográficas perdem a cada dia cores.

Já andei por muitos lugares e ainda tem muitos para ser meu um pouquinho. E me pego esquecida de lembranças e por alguns momentos me fazia lembrar.

Pego-me novamente esquecida de lembranças. Quando chegam não encontram mais contextos e nem formam textos, por causa desse medo que te ronda, deve ser os cinzas! Não pensei que poderia fazer mal e nem bem, apenas fazer algo. Movimentar moléculas. Fazer sangue circular. Músculos fortalecer. Pele exalar cheiros. Tatos vibrar na ponta dos dedos sujos de tintas, do carvão, da caneta, dos micróbios ao teclar. Só fazer algo! Fazer ventos soprar cabelos, homem virar pó e pó fertilizar a Terra. Flor brotar a olhos vistos. Só fazer algo! Coração brotar galhos e folhas. Brisas serem geladas como Ártico e frescas como a do mar dentro de nós. Só fazer algo!

Não podemos ter tudo na medida em que queremos, não é? Mas eu posso! E emprestei de você sentidos e significados que talvez não tivesse intenção de emprestar. E te devolvo na media. Fiquemos no tempo então, com o que compartilhamos.

Não seja formal e sim real. Diga verdades e não faça promessas que não pode ou tenha a intenção de cumpri-las. Todas foram falhas. Sabe por quê? Não quis perder, mas também não soube ganhar e está aprendendo a cuidar. Como quer rosas se não cultiva a roseira? Como quer ver borboletas se o jardim está seco, vê flores? Já viu uma crisálida abrir? É preciso paciência para isso! É preciso interessar-se por isso. É preciso dar sabores para isso.

Isso está ai.

Está aqui.

Isso é o que envolve.

Movimenta

Transgride

Percebe

Recusa.

Isso faz parte de tudo e de nada.

É meu

Seu

Nosso

É emprestado

Endividado

Libertado.

Isso causa sentidos e significados.

Raiva

Frio

Calor

Vontade

Desejo

Paladar.

Isso é o que sente fome.

Come

Sacia

Procria

Deglute

Isso mata.

Isso vive.

Devagar

Rápido de mais

Constantemente

Impiedoso

Soberano

De vontade.

Isso não se compra e nem vende.

Escolhe

Doa

Busca

Experimenta

Merece

Conquista.

Isso tem um preço.

É caro

Barato

Está na promoção

Liquidação

Extinção

Extensão.

Isso é que proponho.

Que dá medo

Força

Sondagem.

Isso é sábio.

Tem coragem

Virtude

Liberdade.

Isso tem seu tempo

Não tem pressa

Passos lentos

Curtos

Sente ventos

Sabemos o que é.

Isso está guardado

Enclausurado

Imaculado

Primitivo.

Isso tem vontades

Não sabe esperar

Não quer ocultar

Parar

Mas sabe voltar

Porque isso se basta

Vive consigo

Segura

Confio

Fio

Tece

Isso é o que dizem as línguas.

Traduzem os poros

Buscam os tatos

Escutam os cheiros

Cheiram os sabores

Isso é obsceno

Assim relatam os poetas.

Cris Perônico

10/02/09

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